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ESTIMATIVAS PARA O TEMPO DE DURAÇÃO DAS MEDIDAS DE ISOLAMENTO SOCIAL OCASIONADAS PELA COVID-19 NO BRASIL

Uma Rápida Introdução sobre a Covid-19


Desde seu aparecimento, a Covid-19 (Coronavirus Disease 2019) tem sido matéria de debates e exposições recorrentes por todo o globo.

Discutiram-se diversos mecanismos e sistemáticas para conter a disseminação do vírus. Hoje o mundo tem adotado regras de isolamento social como uma providência necessária para que isso ocorra. Tais medidas trazem elevado impacto econômico, de forma que estabelecer cenários quanto à eficácia e duração das mesmas torna-se necessário para subsidiar as melhores decisões de gestão empresarial. Projetar os cenários para o Brasil é o que se propõe aqui.

Os coronavírus são uma família viral já conhecida, responsável pelas epidemias de SARS e MERS, que produziram suas próprias crises no passado – por volta de 2003 e 2015, respectivamente. A Covid-19, porém, diferente das demais, se caracteriza por sua disseminação extremamente veloz, dobrando o número de casos registrados a cada 2,4 dias em um cenário sem ações de isolamento social. Enquanto as outras pandemias não atingiram 10 mil casos, esta já se aproxima de 1,5 milhão. Isto sem contar o fato do número oficial subestimar o contágio efetivo, pois se estima que para cada um caso de teste confirmado existam outros quatro casos positivos não testados. Sabe-se que a maioria dos casos são assintomáticos. Esta difusão acelerada fornece ao vírus incontáveis oportunidades de se reorganizar geneticamente, de forma que, conforme ele se propaga, ocorrem mutações. Isso pode fazer com que pacientes já recuperados voltem a ser acometidos pela doença, o que aumenta a dificuldade em se estabelecerem prognósticos sobre a contenção da epidemia.

A natureza exponencial da transmissão faz com que o número de casos cresça em curvas de progressão geométrica acentuadas, provocando um número de casos muito além do que os sistemas de saúde são capazes de suportar. Sem qualquer implantação de controles, ele cresce a uma razão de 33% ao dia sobre o número de casos totais do dia anterior. Taxas de crescimento de 10% ao dia vem sendo obtidas sob regimes de elevado isolamento social, mas, além deste crescimento manter o fator exponencial, as medidas não são economicamente suportáveis no longo prazo. O maior desafio de qualquer país infectado hoje consiste em (i) ser capaz de conter a rápida disseminação da doença para proteger sua população da mortalidade causada por ela e (ii) não sobrecarregar seu sistema de saúde, assumindo o custo de lesar as atividades produtivas e uma possível recessão na nação. Laboratórios estimam cerca de até 18 meses para o desenvolvimento de uma vacina e sua eficácia ainda se torna questionável em função das já conhecidas mutações que o vírus vem sofrendo. Medicamentos testados em pacientes infectados ainda carecem de testes mais conclusivos para provar sua eficácia. Tudo aponta a necessidade de que as medidas de restrição e quarentena continuem sendo tomadas no Brasil em linha com o que vem sendo adotado em diversos países.

A fim de se ter uma sensibilidade quanto ao horizonte de tempo que este isolamento poderá durar no Brasil, investigamos como foram conduzidas as restrições em outros países: a natureza da restrição, seu prazo, o grau de rigor de sua aplicação e os resultados obtidos na sequência. Munidos de dados sobre os demais países acometidos desta epidemia severa, pudemos conceber estimativas acerca dos potenciais desdobramentos que seguirão.

Uma Simplificação das Etapas no Controle da Epidemia


De maneira geral, observamos características comuns a todas as nações: se não forem adotadas quaisquer condutas de contenção, o crescimento em poucos dias satura o sistema de saúde. Por outro lado, caso seja conduzido algum isolamento social, esse crescimento cai. Contudo, se o número de casos diários não tende para zero, conviver com medidas de forte isolamento social por um longo período é uma situação insustentável pelos efeitos econômicos que gera. As experiências bem-sucedidas indicam ser necessária uma supressão suficientemente sólida para quebrar o ciclo de contágio do vírus e praticamente eliminar a contaminação local. Feito isto, então o país e sua sociedade podem atuar em uma nova fase, em que, com um pequeno número de casos, seja possível rastrear e controlar os casos existentes.



Nos estudos realizados pela FG/A, não foi encontrado um modelo preciso e aceito por todos para projetar o fluxo de contaminação da COVID-19. Assim, ao invés de avaliar somente o crescimento do número de casos novos sobre casos totais, como apresentado no gráfico acima, optamos por construir uma métrica que nos permita acompanhar os resultados das medidas de isolamento nos números de casos diários frente ao número de casos mais recentes. Passamos a medir este efeito dividindo o número de casos de um determinado dia pela somatória do número de casos nos 10 dias anteriores e nomeamos este índice de “indicador diário de contaminação”. Embora essa métrica tenha suas diversas imperfeições como aquelas oriundas de uma eventual ampliação ou redução no número de testes ou mesmo quanto a uma demora entre a contabilização do caso e o dia que foi efetivamente realizado o teste, acreditamos que se trata de um bom indicador. Através dele podemos verificar a tendência de queda ou não no número de casos. A partir daqui, sempre que citarmos o “indicador diário de contaminação”, estaremos nos referindo ao índice calculado segundo esta sistemática.



O Caso da China


A China certamente se mostrou capaz de conter a alta disseminação do vírus e já desfruta de um cenário sob controle no qual as medidas de isolamento puderam ser afrouxadas. Para tal, dispôs-se das mais austeras restrições, controlando de forma inflexível as atividades e o fluxo de pessoas. É importante notar qual foi o horizonte de tempo entre determinadas medidas adotadas e o resultado obtido em termos de redução no crescimento do número de casos.

É razoável supor que há uma defasagem de tempo entre a data em que as medidas de isolamento são formalmente adotadas e seus efeitos. Quando as medidas de isolamento são adotadas, um determinado universo de pessoas já está contaminado e estes casos já existentes irão refletir nos números de novos casos nos dias subsequentes à adoção das medidas de isolamento. Então, para analisar o efeito de determinadas medidas, nossas mensurações consideram os resultados obtidos 10 dias depois da adoção destas.

Já no início do ano, em 23 de janeiro, a China determinou o lockdown (bloqueio completo) na cidade de Wuhan, onde o vírus foi descoberto. Dez dias após essa medida, no dia 2 de fevereiro, o número de casos continuava crescendo à uma taxa de 36,9% sobre o número de casos acumulados no dia anterior. Nessa data, o “indicador diário de contaminação” era de 29%.

Embora tenha havido o fechamento da cidade de Wuhan, o vírus já havia se espalhado por outras regiões da China (e do mundo) implicando em medidas mais rigorosas para sua contenção. No dia 13 de fevereiro, foi instituído o fechamento de todos os negócios ditos “não essenciais” em toda a província de Hubei, onde estava localizada a cidade, e também medidas em diferentes graus em outras regiões da China. Juntamente com isto, houve elevada restrição no fluxo de pessoas das regiões infectadas para outras. Este controle foi então efetivo para em 10 dias derrubar de aproximadamente 3 mil para menos de 1 mil o número de casos diários. O indicador diário de contaminação nesse cenário caiu para 2%. Passou-se outro ciclo de 10 dias e o número de casos diários caiu para menos de 100.

Em 05 de março, exceto na província de Hubei, a China já pôde verificar o retorno gradual das atividades. Neste dia o número de casos diários mantinha-se em torno de 100 e o índice ra de 3%. Em 28 de março a própria província e a cidade de Wuhan também começaram a vivenciar o retorno das atividades.

O que podemos notar aqui é que, entre a data da adoção das medidas rigorosas de isolamento, ou seja, 13 de fevereiro, e o retorno gradual das atividades em Hubei, se passaram 44 dias. Assim, considerando que a China chegou a atingir a marca de 4 mil casos diários e depois caiu para 100, este seria um bom horizonte de tempo da duração do isolamento em regiões mais críticas. Tomando como base o restante da China, onde em 05 de março já se verificava o retorno das atividades, vimos um horizonte de 18 dias.



O caso da China pode então ser visto como um caso de sucesso, porém há a necessidade de se fazer ressalvas. Uma delas (talvez a principal) é quanto à capacidade de outros países implantarem medidas semelhantes quando analisamos sob a ótica das diferenças culturais e governamentais destes países em relação à China. A forte restrição no fluxo de pessoas entre as regiões contaminadas e as demais regiões foi fator que permitia a abertura gradual da China enquanto Hubei se mantinha bloqueada.

A Coréia do Sul


A Coréia do Sul pode ser um exemplo de como a fase de controle funciona. De forma similar à China, note que o número de casos por dia tem uma rápida expansão, crescendo a 22% ao dia e chegando a se aproximar de 1000 novos casos por dia. A experiência adquirida durante a crise de MERS, severa no país, elevou o preparo das autoridades e a população rapidamente adotou medidas de controle e rastreamento, não permitindo que o número de casos seguisse sua natureza exponencial. Note que após o pico de casos diários, em um horizonte de tempo próximo de 10 dias, já cai para próximo de 100 casos e assim se mantém.



Observe que no dia 19 de fevereiro, após identificação do paciente de número 31, a Coréia do Sul ordena o isolamento social, reduzindo o crescimento diário de 22,1% para 9,9%. Ao descobrirem que esta pessoa continuou frequentando as cerimônias religiosas de sua igreja, as autoridades se esforçaram para rastrear seu caminho de contágio, realizando testes em todos os cidadãos da mesma fé. Adicionalmente, os coreanos dispuseram de testes em ‘drive-thru’ com resultados rápidos, permitindo um nível notável de controle e monitoramento. Em 13 de março, o número diário de casos novos já era inferior ao número de enfermos recuperados.

Uma questão aqui chama a atenção: o número de testes e a elevada capacidade do país em testar a população. No entanto, algumas considerações devem ser observadas para se chegar a conclusões mais realistas. Pelo número de casos confirmados em países como a Itália ou Espanha, podemos inferir que o número de pessoas testadas na Coréia do Sul não foi significativamente maior. O ponto a se atentar aqui é que quando o número de casos é pequeno, os testes disponíveis são suficientes para se testar os casos assintomáticos e então realizar o maior controle sobre a propagação do vírus. É assim que a Coréia do Sul vem atuando para manter a proliferação do vírus sob controle.

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O caso da Itália


A Itália, por sua vez, evitou tomar medidas mais severas a princípio, mas viu-se obrigada a seguir os passos da China, após fracassar com ações mais brandas.



Em 22 de fevereiro, a Itália declara o lockdown da chamada ‘zona vermelha’, que abrangia 14 províncias, principalmente na região da Lombardia. Neste dia o número de casos total ainda era pequeno (80) porem o “indicador diário de contaminação” de 69,7% já indicava a velocidade de crescimento do vírus. Embora imposto o isolamento da região, as restrições às atividades comerciais eram ainda muito amenas, não contendo a disseminação exponencial da epidemia no país. Entre os dias 7 e 11 de março, quando a média do número de casos diários já atingia 1.200 e a do “indicador diário de contaminação” estava em 23%, admitindo que restrições mais duras eram vitais, as autoridades realizaram o shutdown de todo o comércio ‘não-essencial’ e o estenderam para todo o território nacional. Ainda assim, as medidas se mostram insuficientes para restringir o fluxo de contaminação. Em 22 de março, incluem o fechamento da indústria ‘não essencial’ entre as medidas de isolamento, estando a média do número de casos dia em 4.400 e a do “indicador diário de contaminação” em 18%.

O mundo vem observando com atenção o número de novos casos na Itália. Ainda que a redução tenha acontecido de forma mais lenta que a China, acredita-se que nos próximos dias precisará apresentar novos recuos para viabilizar o retorno gradual às atividades ou então rever a eficácia das medidas de isolamento. Em 14 de abril a média de casos dos últimos 3 dias foi de 3.900 e o“indicador diário de contaminação”, embora tenha caído, ainda estava em 7,7%.

Estatísticas a respeito da movimentação de pessoas na Itália podem ser obtidas em Google COVID-19 Community Mobility Reports onde é possível observar elevada redução - dados disponíveis até 05 de abril.

O Brasil


O Brasil teve o privilégio da contaminação comunitária pelo COVID-19 ter ocorrido mais tarde e então ter em mãos as trajetórias e estatísticas dos outros países que foram atingidos mais cedo.

Assim como em outros países, após a contagem do caso de número 100 e sem qualquer medida de isolamento social, a razão do crescimento do número de casos é exponencial dobrando a cada 2,4 dias. O nosso “índice diário de contaminação” girava ao redor de 40% neste período que precede a adoção de tais medidas.

A partir do dia 12 de março, já se observaram ações espontâneas de isolamento e cautela, dada a repercussão da pandemia na Europa. Isso conteve parcialmente a expansão excessiva, mas esta manteve-se alta, com o “indicador diário de contaminação” apresentando média de 39% nos dias anteriores ao dia 23 de março, data em que medidas mais rigorosas passam a ser adotadas por todos os estados do Brasil.

A partir das observações provenientes de outros países, estimamos que a trajetória em território nacional será análoga a deles. A suspensão de serviços e determinação de quarentena já provocaram mudanças do “índice diário de contaminação”.

Em 23 de março, quando medidas de suspensão do comércio e serviços não essenciais são adotadas no estado de São Paulo, o Brasil apresentava em torno de 350 casos diários e um “índice diário de contaminação” de 24%. Ao final do dia 14 de abril, o número de casos apresentou uma média de 1.600 casos nos últimos 3 dias e o “indicador diário de contaminação” uma média de 11%.

É visível que o Brasil conseguiu segurar o crescimento do vírus e não permitir a saturação do seu sistema de saúde. Por outro lado, ainda que com um número de casos diário menor quando comparado com outros países, o nível atual de isolamento poderá não ser suficiente para vermos uma contínua redução, especialmente se considerarmos que o “indicador diário de contaminação” apresenta indícios de ter se estabilizado em 10%. Medidas mais efetivas de isolamento poderão ter que ser adotadas para solucionar o problema mais rapidamente ou nos aproximaremos de um cenário em que a população não suportará a manutenção do isolamento. Os números nos próximos dias serão determinantes para visualizarmos o caminho a ser seguido.



Considerações Finais


Será importante observamos a evolução no número de casos nos países que vem adotando medidas de isolamento social. Estas medidas não podem ser analisadas de forma isolada pois estão sendo adotadas em conjunto com outras, como ampliação no número de testes, utilização de máscaras e, dentre outras, diferentes níveis de controle das autoridades sobre o fluxo de pessoas.

O caso da Itália terá muita importância por se tratar do país ocidental onde a situação tomou patamares críticos e as medidas de isolamento social foram primeiramente adotadas pelas autoridades governamentais.

A Itália, nos últimos dias, tem conseguido reduzir o número diário de casos e aliviar seu sistema de saúde, reduzindo o número de mortes. Agora é preciso verificar se tais medidas serão suficientes para retornar à gradual liberação do isolamento ou se medidas ainda mais restritivas terão que ser adotadas.

Não é possível desprezar o fato de que nos últimos dias observa-se uma possível tendência de estabilidade no número de casos e a média dos últimos 3 dias do “indicador diário de contaminação” da Itália está em 9,6 %. A manutenção deste índice e um patamar de 3.900 casos por dia, já não nos permitia afirmar que esta liberação do isolamento viesse a ocorrer no prazo inicialmente previsto pelo decreto (a princípio até dia 13 de abril, mas já prorrogado para 3 de maio).

Assim, considerando que já estamos há 20 dias de quando medidas mais restritivas foram adotadas na Itália e contrapondo os resultados obtidos na China em período equivalente, deveremos estar atentos pois: (i) estes números cairão nestes próximos dias ou (ii) diferentes medidas e decisões deverão ser adotadas por parte do governo.

Com o propósito aqui de estabelecer sensibilidades quanto ao horizonte de tempo de duração das medidas de isolamento no Brasil, considerando este intervalo de 10 dias entre a adoção das medidas e sua posterior solução, entendemos que não conviveremos com este cenário de paralisação por período superior a 60 dias. Conviveremos com avanços e retrocessos que continuarão colocando bastante incerteza nos próximos 30 ou 40 dias, porém o horizonte de tempo não deverá se estender.

Tomando-se como base que as medidas de isolamento no Brasil foram adotadas durante a semana de 23 de março, estimamos que estas se encerrarão antes do final de maio. Em estados em que o número de casos seja menor, este prazo será mais curto, o que não acreditamos ser o caso do estado de São Paulo, já que concentra o maior número de casos brasileiros.

Entendemos que o caso da Itália será a melhor referência para o Brasil e acreditamos que viveremos um cenário de adoção de medidas de isolamento que poderão ser ampliadas ou reduzidas em função de melhoras ou pioras nos resultados diários.

Como a velocidade de transmissão do vírus é muito elevada quando não se adotam medidas de isolamento social (dobrando a cada 2,4 dias), caso flexibilizações do isolamento sejam tomadas de forma equivocada, o erro aparecerá rapidamente através da saturação do sistema de saúde. Por outro lado, se medidas mais duras forem requeridas e não adotadas, a sociedade não suportará prolongar o isolamento que, se rompido, fará novamente com que o sistema de saúde seja saturado e o isolamento volte a ser adotado. Isto é o que nos faz crer que o horizonte de tempo é o aqui discutido.

Este cenário de avanços e retrocessos pode estender o tempo para a solução do problema, porém, dada a velocidade de contaminação do vírus e os efeitos econômicos da paralisação, alternando-se entre uma decisão e outra, não acreditamos que seja possível vivenciar uma paralisação que adentre o mês de junho.

De posse destas variáveis, manteremos os números em observação e, conforme sua evolução, revisaremos os cenários aqui estabelecidos. Por hora, podemos afirmar que estas são as mais adequadas sensibilidades que temos para as paralizações oriundas do COVID-19.